domingo, 22 de setembro de 2013

A grande panela: guardávamos tudo nela, com perspectivas de um dia de cozimento.  Essa panela era do mundo. E, sim, houve épocas em que a vontade de que daquela panela saísse algo de saboroso, de proveitoso, foi maior que a vontade de cozinhar. Ficávamos nos preparativos.  A panela era rude, forte, não trincava nem nada.

Eu mesmo (quem diria!) depositei nela alguns poemas, alguns escritos, algumas visões de futuro – bobagem. Alguns depositaram sentimentos muito profundos, uns inclusive que não eram conhecidos. Os escritores mais tradicionais fizeram questão de depositar toda a modéstia recolhida em anos e anos de dedicação aos livros publicados, mas, de certa maneira, emitiam o mesmo frenesi que os escritores chamados de “mentes mais abertas”. O que é até justificável porque, se você ver bem, escritor é a mesma coisa sempre.

Certa vez, não coube mais nada na panela. Sim, aquela paradoxal panela não suportava mais nenhum conteúdo. O que fazer? Esta panela era o mundo. Como fazer? Fiquei me perguntando como eu agiria dali para frente mediante àquele marco histórico. Sim, afora qualquer discussão filosófica ou intelectualista acerca das coisas, eu considerava aquele momento um fato histórico. Pois bem, perguntei-me, perguntei-me e não obtive resposta – e isso me deixou profundamente confuso, para não dizer encabulado. As outras pessoas eu não sei se fizeram esse questionamento, se entraram nesse parafuso. 

Aliás, as outras pessoas foram questionando tanto, se envolvendo tanto com o problema da panela... e se esqueceram. Esqueceram-se da panela! Daquele objeto de culto, daquele dispositivo racionalista, religioso, puro, emblemático. Haviam se esquecido!

Sinceramente, vim aqui registrar esse caso da panela, pouquíssimo certo se também me esqueci. Ou ainda, por que eu me lembraria? É um caso sério, com certeza. E que coisa estranha é a memória, concluo, que me embaraça e me consome, tal como panela. E que coisa estranha é o tempo, que conclui, feito tampa.


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